domingo, 8 de novembro de 2009

Rei sem Coroa.

A mesa, ao lado, estava ocupada com uma família composta por cinco pessoas. Um pai, uma mãe e três filhos, um menino e duas meninas. As crianças pareciam robôs. Todo gesto necessitava da aprovação do pai que fiscalizava até os pensamentos das crianças e da pobre moça, sua esposa, que agora mesmo se esforçava para satisfazer as vontades do marido. Ele era grande para a sua geração. Devia passar quase uns trinta centímetros do mais alto conterrâneo, o que não justificava a forma de expressar, seu comportamento de amor ou ódio, em relação àqueles que ele julgava como família. Aparentemente as crianças tinham pavor e terror dele tanto como pessoa tanto quanto de pai. A ordem tinha que ser cumprida à risca e a mãe, coitada, só aplaudia o erro, ou pelo menos o que ela julgava errado, na educação, mas, não tinha coragem para expressar, e, permanecia ali quieta, esperando a aprovação do marido.
O mais velho não parava de olhar as outras crianças brincando no parquinho, no pula-pula, na piscina de bolinhas, na escada de cordas, no escorregador, e, ficava ardendo com a vontade de ir também brincar lá, mas, sua vontade era enfarruscada com o rosto severo do pai que agora olhava para ele como se estivesse lendo seus pensamentos. As duas meninas tentavam sublimar seus desejos de brincadeira comendo gulosamente um dos pedaços de pizza que viera à mesa. O pai já mandara a garçonete voltar e trocar por duas vezes as cocas-colas das meninas, pois tinham que ser light e a garçonete as trouxera normal. Ele tinha falado grosseiramente e a garçonete mais que depressa atendera quase de imediato o pedido temendo confusão.
Que infelicidade, pensei. Não é na disciplina exagerada que a felicidade reside. O sofrimento psicológico e o constrangimento de ser manipulado eram patentes e nada havia para ser feito, pois, necessitaria da aprovação da família como um todo e esta estava totalmente desfiada, dilacerada por ordens incompreensíveis. Que pena, para as crianças, continuei pensando.
A bagunça na outra mesa perto da nossa, promovida pela alegria incontrolável de outras crianças que gulosamente e prazerosamente devoravam seus pedaços de pizza, com refrigerante, era exatamente o contrário da mesa anterior. O pai, com um enorme rabo de cavalo, brincava com os quatro meninos e com a mãe, pareciam felizes. Antes da chegada da pizza as crianças tinham exaustivamente brincado no pula-pula e no escorregador e a mãe atenta observava constantemente os movimentos delas, protegendo-as. Observei que a felicidade era algo palpável ali no seio daquela família.
Olhei para o meu neto, com sua boquinha completamente recheada de pizza, e, fiz uma careta para ele que me respondeu com outra. Ele estava sentado bem à minha frente, ao lado de sua mãe. Senti-me feliz por estar ali com os meus, em harmonia, em paz, sem a preocupação de afirmação de autoridade ou a extrema manifestação de autoridade sem amor, e, sim uma discipulada pelo medo e infusão de ódio no psicologismo daquelas crianças.
Terminamos e quando me enderecei à saída, defrontei-me obrigatoriamente com o autoritário pai e sua acuada família, que agora, com as crianças cabisbaixas, se equilibravam na linha paranóica da normalidade. O imperador, ereto, orgulhoso de ser ele o mandatário do poder familiar e cegamente obedecido, sem saber que mais tarde a vida cobrará a falta de equilíbrio e então ao me virar, na direção da saída, me deparei com a outra família sorridente, cheia de vida, expressa em suas brincadeiras, e, vi o rei sem coroa, feliz de comandar sem nímio esforço sua própria comunidade e imediatamente me identifiquei com essa e saí da pizzaria feliz de também não possuir coroa, nem reino, e, sim fazer parte da maior e melhor universidade que existe no mundo que é a família, essa comunidade espetacular, a nos ensinar dia após dia o bê a bá da vida.

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