sábado, 21 de novembro de 2009

Mude homem, então.

Em Kolyma’s Tales, Varlam Shalamov descreve os horrores da reclusão em tal prisão, onde esteve presidiário por dezessete anos, na Rússia e chega à conclusões tremendas a respeito do ser humano e suas relações. A tragédia, forte e imprevista, presente na vida de todos nós humanos, impinge a todos, em sua ausência ou fraca manifestação, uma felicidade que realmente, infelizmente, não é inerente ao homem, pois, é dependente de seu tamanho e duração dessa tragédia. Não há amizade ou amor na tragédia e se por um motivo qualquer florescer, nesse deserto algo parecido, é que não houve intensidade suficiente, força trágica, para o preenchimento das necessidades individuais requerida em todos os momentos da vida, e, portanto, na tragédia também.
De alguma forma as necessidades de preservação da espécie, de saciação da fome, de defesa de si e de seus mais próximos, de ter que mostrar, para um conjunto, sua capacidade de dar volta por cima, de brecar a forte pressão social, na tragédia, que empurra o homem para o fundo de um caldeirão de emoções e sentimentos, onde o instinto de sobrevivência se manifesta em toda sua intensidade, e, não há mais lugar para a solidariedade, amizade, amor, companheirismo, carinhos, amenidades, e, o que passa a ser o universo humano é somente a busca pela sobrevivência de sua dignidade que vai desvanecendo à medida que o tamanho e a duração da tragédia aumenta.
Impressionante o momento de sua liberdade que ele está retornando à Moscou. Liberdade e o peso de dezessete anos de prisão, humilhação e anulação do ser e de repente a sensação de sentir-se obrigado, cobrado, pela dádiva da liberdade, de ter que esquecer aqueles dias, o que ele recusa imediatamente, e, só consegue descansar e dormir depois que entende que é impossível viver sem a lembrança do passado massacrante, e, que isto faz parte de seu ser, e, então ele dorme, descansado, em paz consigo mesmo, na viagem de volta à vida. Em Moscou toma conhecimento que sua esposa o abandonara e vivia com outra pessoa, seu filho não quer mais vê-lo e com todos esses massacres continuou a viver até sua morte aos setenta e cinco anos, entendendo que a tragédia é quem determina a vida das pessoas e a compreensão da maldade humana vai além, muito além do vernáculo, da simples maneira de falar o mal. Há uma espécie de determinismo histórico. Ao homem é dado viver as tragédias que ele mesmo produz.
No Olimpo os deuses devem se divertir com as mazelas que o homem impõe a si próprio. Traçam seus destinos, com seus livres arbítrios, e, vão massacrando uns aos outros, e, enquanto a tragédia não bate a sua porta os homens, insanos vão vivendo suas vidas, pensando que são felizes.
Ainda há tempo de mudança. O homem, causador e criador das tragédias, deve pensar o quanto ele concorre para a morte ou sofrimento efetivo de seu parceiro, esposa, marido, filho, filha, netos e amigos, sua comunidade, sua cidade, seu estado e seu país, e, seu mundo, com suas ações, com seu modo de agir diante de problemas, de problemas individuais que têm na relação interpessoal, do massacre que, às vezes, é imposto de modo impensado e desleixado. O homem criou um método de fazer ou criar tragédias no seu dia a dia, principalmente quando tem poder nas mãos. Tem como massacrar fisicamente, psicologicamente, ou de qualquer maneira com suas iras repentinas, seus preconceitos e seus desamores, a quem diz que ama e que respeita, mas, que na verdade só vende a imagem de que é um ser humano bonzinho e que pensa no bem da humanidade, do ser humano, principalmente nos mais perto, dos seus amores na natureza.
Mude homem, então.

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