sexta-feira, 23 de outubro de 2009

O brincalhão.

O grupo era formado por profissionais liberais, comerciantes, industriais, políticos, senhoras viúvas, estudantes e profissionais de turismo que serviam de guias para o agrupamento de pessoas tão diversificado. Tinha um professor de geografia que daqui de cima, no avião, ia descrevendo, logo que apareceu, a enorme cordilheira, chamada de Cordilheira dos Andes. De cima, vista dali era um enorme dorso de rocha a serpentear, como se fosse um costado de um réptil, em direção ora noroeste, ora norte em posição a cidade de Bogotá, na Colômbia, a saída fora Manaus, AM, Brasil. Seus píncaros geralmente eram cobertos de neve e davam a sensação grandeza e ao mesmo tempo de descanso, talvez, por sua brancura.
O vôo fretado ia para Santo Domingos, capital da República Dominicana, uma ilha geminada com o Haiti. O possante avião se dirigira primeiro a Bogotá, Colômbia, onde seria abastecido e, depois, seguiria para Santo Domingos em um vôo direto a partir dali.
As conversas eram as mais diversas e já mostravam a formação de pequenos grupamentos de pessoas, talvez, porque há essa necessidade de aproximação com os afins, no ser humano. Um político se arriscava a fazer previsões sobre as eleições iminentes de sua cidade para um senhor que pelo porte, sua barba e os óculos redondos, o que arredondavam ainda mais sua face, deveria entender de política:
- As chances de o senador ganhar as eleições são grandes, mesmo porque, não há alguém com o perfil de opositor eficaz que consiga sobrepô-lo, agora, se o governador se posicionar em outra direção, então, o resultado certamente mudará.
- Conheço bem os dois. Isto não vai acontecer, porque, todos os acertos foram feitos e até onde sei nenhum dos dois vai “arredar o pé” do combinado, falou o outro com convicção de quem realmente conhecia os meandros desse círculo.
Lá no fundo do avião, um rapaz, brincalhão, se esbaldava de rir do constrangimento que impusera a uma sisuda senhora sentada a seu lado. Soltara, de propósito, uns pútridos gases, flatos, que no momento percorriam toda cabine da aeronave para o desespero de todos, como se fora eflúvios malignos. Algumas pessoas reclamaram bem alto, chegando quase aos gritos repreendendo tamanha falta de educação. Ele ria a não poder mais e outras pessoas também riram disfarçadamente.
- Ele não é bom da cabeça, dizia uma senhora, consolando a outra, e, tentando se controlar.
- Ele é um grosso, um mal-educado. Sujeito grosseiro. Olha lá, parece-me chegamos a Bogotá, respondeu ela desanuviando a mente e apontando para a vista que a manobra do avião deixava entrever, a cidade de Bogotá.
Bogotá nesta época dessa viagem era uma cidade que apesar de muito bonita causava receio nos turistas por conta da violência imposta ao país derivada da guerrilha urbana, patrocinada pelo tráfico de drogas, os famosos cartéis, o que não acontece nos dias atuais por conta da grande atitude repressora do governo em relação ao problema. O grupo teria que permanecer no aeroporto umas duas horas. Para diminuir a tensão foi liberada a permanência dos viajantes no free shopping do aeroporto. Os guardas, do exército nacional, sem preparo algum no trato com os turistas faziam de tudo para estabelecerem uma espécie de comunicação com os estrangeiros, a fim de executarem suas tarefas, antipáticas, de revistar bolsas e pertences de todos os passageiros. Nada ficara de fora da revista. Todos sem exceção entraram na sala de revista e nela foram revistados. Cães farejadores, presos a coleiras, andavam com focinhos baixos, farejando todas as bolsas e pequenas sacolas de viagens. O brincalhão agora estava sério e cauteloso, pois, os soldados pareciam robôs, autômatos prontos para prenderem qualquer um que justificasse uma “procura” melhorada. Seu rosto ficara cômico, para quem o observara no avião contando piadas e mexendo com um e outro, e, o vira tão gozador, antes tão gargalhador, agora tão sério que parecia outra pessoa, solícito aos reclames dos soldados.
- Abra sua mochila, por favor, ordenou o guarda com rispidez.
- Pois não, respondeu ele célere, abrindo sua mochila.
A visita ao pequeno shopping transcorreu normalmente, sem a necessidade de compras por parte de ninguém. Só o político que resolveu, em uma loja de jóias comprar um anel, caro, todo cravejado de diamantes para sua esposa, que agora, exibia-o para as outras senhoras e em algumas despertando inveja.
De lá o avião dirigiu-se para Santo Domingos, a bela cidade, incrustada nas montanhas e serras da ilha na República Dominicana. Os espanhóis, colonizadores, construíram hotéis refinadíssimos, em madeiras de lei e vidros, acompanhados de campos de golfe, e toda uma infra-estrutura para o deleite visual dos turistas. Os guias e seus auxiliares, personal trainning, dancings, e, outros profissionais faziam ou procuravam fazer a alegria de todos. Na piscina, nas quadras, nos exercícios aeróbicos, enfim, todos empenhados na diversão e descontração das pessoas.
- Acho que vou fazer hidroginástica, disse a esposa de um dos comerciantes, que no momento estava empenhado a secar uma lata de cerveja, bem gelada, o que era totalmente convidativo, pois, o sol era muito quente. Atrás do hotel, a praia particular, atrás dos coqueiros, onde a areia era mais branca, descortinava o verde claro do mar do Caribe, quebrando espumosamente. Algumas gaivotas, barulhentas, passavam em pequenos bandos, e, os pelicanos com seus enormes bicos, sobrevoavam a água na esperança de vê e pescar algum peixe. De vez em quando mergulhavam e traziam nos bicos, peixes.
Algumas famílias estavam deitadas em toalhas, ou em cadeiras de sol, se bronzeando enquanto seus filhos brincavam ou na areia da praia ou se banhavam no mar. Lá longe, perto do horizonte um navio passava ao largo. Aqui as folhas dos coqueiros balançavam e emitiam sons quando da passagem do vento por elas. Os garçons solícitos iam e viam com os pedidos feitos. Um casal saboreava uma mariscada e bebiam Marguerite, uma bebida, mistura de suco de abacaxi e vodca com gelo, batida no liquidificador.
Alguém lembrou que o melhor depois da praia era o encontro de todos para jantarem juntos em algum restaurante. A idéia espalhou-se e logo era censo comum. Às 20:00 hs todos se encontrariam no hall do hotel. O brincalhão imaginava o que poderia fazer para “gozar a cara” daqueles bobões.
As duas senhoras apressaram-se subindo mais cedo para a suíte do hotel no afã de estarem no horário no hall. Entraram no elevador e não observaram que o Brincalhão estava espreitando-as por trás de uma grossa coluna perto do balcão de atendimento, no hall do hotel. Subiram e já se dispunham a tomar banho, primeiro uma depois a outra, quando o interfone tocou, a mais velha foi atendê-lo:
- Alô, pois não?
- Senora, su carne está a subir, su filé mingon, era o gozador tentando falar castelhano.
- Perdão, não lhe entendo. E, dirigindo-se à mais nova. Será que você pode atender, pois, eu não consigo entender o que este homem está dizendo. Ela tomando-lhe o fone, falou:
- Pois não?
O brincalhão enrolando a língua falou alguma ininteligível frase e desligou, mas, a frase marcara a mais velha que resolveu ir até o balcão do hall, reclamar que não havia pedido nenhuma carne ou filé para sua suíte, já que iam jantar fora. Lá, atrás da coluna o gozador se divertia com a situação embaraçosa das senhoras.
E, assim, foi de gozação em gozação, passando-se os dias, até que chegara o dia de voltar. O caminho de volta era o mesmo da ida. O avião levantou pontualmente no horário combinado e logo estabilizado no ar, deu chance para a brincadeira mais chocante do brincalhão. O caso transcorreu assim.
As aeromoças passavam pelo corredor, solícitas aos passageiros e lá pelas tantas, o brincalhão levantou-se e se dirigiu atrás da comissária que não via no corredor, entre as cadeiras. Ele rindo estava vestido com um avental que quando levantado deixava subir um membro sexual masculino, grande e ereto, e, quando a moça deu por si a risadagem estava no auge. Constrangida, mas, levando na esportiva, pediu a ele que se sentasse.
Alguns senhores, então, resolveram fazer uma brincadeira de volta e contrataram entre si o que fazer.
O avião aterrou e estacionou no lugar indicado, no aeroporto de Bogotá. Novamente as revistas foram necessárias. Quando chegou a vez do Gozador, este ainda vestido com o tal avental, e, logo após ter feito uma demonstração com um dos senhores do grupo, mostrando-lhe o que acontecia quando levantava o avental, o guarda falou-lhe:
- Senor, siga-me cá. E dizendo isto o levou para uma das salas daquele andar, onde estava escrito algo como Guarda Nacional, uma espécie de Polícia Federal, dando-lhe entender que estava preso.
Ela empalideceu na hora. O sangue fugiu-lhe, instantaneamente das faces. Olhou desesperado para os colegas de viagem na esperança de receber apoio por parte deles, mas, nada. Ninguém olhava para ele. Entrou na sala e o guarda saiu e depois de fechar a porta atrás de si, fez um sinal de positivo ao barbudo que o contatara e pedira-lhe aquele favor, que custara algum trocado. Perto da partida do avião liberam-no e ele saiu da sala resmungando e entrando no avião foi direto para seu lugar e passou o resto da viagem sério, com ar de muito desgaste, mas, aliviado de ter sido solto e não ter ficado preso em um país tão violento como aquele e entendendo que nunca mais faria brincadeiras tão grosseiras com outro ser humano.

Nenhum comentário:

Postar um comentário