sábado, 19 de setembro de 2009

Patinete.

A visão de criança é puerícia pura, não há maldade. Cincas atrás de cincas, logicamente sem a veleidade dos atos, ocorrem com certa assiduidade na vida dos pequenos. Mesmo assim a vida se exprime nessas vidas de forma impressionante. Morávamos em uma rua íngreme, muito íngreme, e, a prefeitura mandara, exatamente nessa semana, asfaltá-la, para deleite dos moradores. A rua ficara mais larga, por conta do trabalho magnífico dos tratores, essas máquinas maravilhosas, e, depois de quase um mês desse trabalho a manta asfáltica estava pronta para ser usada tornando-a uma espécie de ribanceira mais íngreme ainda, mas, muito lisinha para o uso, apropriada para o patinete que ganháramos no natal e que ainda não tinha sido usado.

Era vermelho e suas rodas pretas, com uma calota prateada. Tony, meu irmão mais velho, logo quis mostrar sua habilidade na manobra com o patinete. Fomos os dois, ladeira acima, empurrando o patinete para depois despencarmos lá de cima, ladeira abaixo. Fizemos umas quatro viagens dessas, e, desmembramos as viagens para que cada um aproveitasse seu próprio momento. O vento forte provocado pela alta velocidade que o patinete atingia aumentava a adrenalina e cada vez mais gostávamos da brincadeira, pois, cada descida era diferente da outra, apareciam pedrinhas em lugares diferentes forçando mudanças céleres na direção, cachorros que corriam atrás da gente latindo e concorrendo com o veículo de duas rodas.

Em uma dessas descidas, Tony estava no patinete e eu lá embaixo esperando por ele, pois, seria minha vez de subir e descer aloucadamente a ladeira, quando um dos pés dele se engatou na lâmina onde terminava o platô do patinete e ele caiu gritando de dor, pois, o pé fora cortado em um golpe bastante profundo, perto do calcanhar. Corri em sua direção na intenção de ajudá-lo e percebi que a ferida seria responsável pelo fim de nossa brincadeira. O sangue jorrava do pé de Tony, o que já era ruim de ver, somado aos gritos que lhe vinham do fundo do ser, gerava uma espécie de um respeito ao desconhecido, e, lembro que prometi aos céus que nunca mais brincaríamos de patinete se Deus salvasse o Tony daquele tormento.

Entramos em casa e querendo Deus ou não, o fato é que de imediato mamãe requisitou o patinete e trancou-o em uma saleta onde se guardava mantimentos:

- Ninguém brinca mais com essa arma.

Fiquei esperando o retorno de Deus, pois, prometera que não mais brincaria assim se houvesse a cura do pé do Tony e assim foi. O pé parou de sangrar, depois de umas suturas feitas no pronto socorro do estado e logo, logo ficou são. Pronto para outra aventura.

Paguei a promessa e nunca mais brinquei com tal brinquedo graças à sábia ajuda de minha mãe que sem querer me ajudou a cumpri-la.

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