sexta-feira, 16 de abril de 2010

Involução.

Lembro-me das férias que passávamos em uma fazenda no interior. A vida no interior do Amazonas não é fácil, ou não era fácil. Não sei como a vida se desenrola agora, mas, naquela época era muito difícil se comparada com a vida que se levava na cidade. Cidadinos penavam na adaptação imposta pela dureza que a vida requeria pela forma como as necessidades eram preenchidas. Lembro-me de como uma simples e sempre bem vinda torneira de água potável fazia falta, constatação essa, na prática, laivada por dores musculares, às vezes intensas, produtos da necessidade de o abastecimento ter que ser feito pela carregação das latas cheias de água apanhada no flutuante na beira do rio e feitas exatamente por nós mesmos. Flutuante é, porque ainda se usa muito, é uma espécie de casa construída sobre gigantescas toras de madeira, amarrado às margens do rio em árvores, e, que servem como um porto na chegada e saída dos barcos. Todas as cidades do interior do Amazonas usam desse recurso para o primeiro contato com os que chegam e também como despedida dos que saem.
Tínhamos, a criançada, essa obrigação, em escala, a de abastecer as panelonas de água que depois de fervida era acondicionadas em enormes potes de barro. Acho que o barro do pote servia para esfriar a água, pois, ela quando servida era sempre mais gélida que qualquer outra no mundo. A água era coada e fervida para então poder ser servida. Era um trabalho árduo e cansativo, mas, gratificante quando a sede apertava e tínhamos ali um refúgio a mitigar a vontade de beber ou de hidratar o corpo. A mesma sensação acontecia com a energia elétrica. A fonte de luz, ou energia, como chamávamos, eram candeeiros, lamparinas, aladins, o que dificultava a leitura ou a simples visão noturna.
Quando retornávamos à cidade eu ficava admirado com as facilidades que a tecnologia nos proporcionava. Bastava um clique para termos luz à vontade nas lâmpadas clareando a vida e os ambientes e um aperto ou desaperto nas torneiras para termos ou não água em abundância sem precisarmos nos banhar com latas menores que tiravam a água de um camburão. Camburão é um enorme vaso, um tonel que era aproveitado para armazenagem de água depois de usado o seu conteúdo, como gasolina, querosene etc... O conceito original de camburão é de um enorme vaso usado para transportar fezes dos presos ou o veículo condutor dos presos.
O mecanismo de banhar-se com o auxílio de uma lata menor retirando água do camburão era lembrado inevitavelmente quando abria-se a torneira do chuveiro e a água caia abundante na cidade grande. A tecnologia tem amolecido o homem. Tudo está ao seu alcance inclusive no interior e também no interior do Amazonas. As ruas asfaltadas e limpas não lembram em nada as poeirentas e lamacentas ruas de minha puerícia, quando passava as férias no interior. Com todas as facilidades que se tem hoje fico pensando se houve e se continua a haver uma evolução para homem. A facilidade da tecnologia tem ajudado a pressa do homem em executar seu dia a dia mais rápido, sua corrida para atingir um patamar de conforto efetivo, com seus carros, moradia bastante confortável e cara, suas roupa que melhoram sua aparência e a venda de imagem, suas compras que às vezes não completam nunca a sua demanda. Balzac diz em uma de suas frases:
- Por trás de uma grande fortuna há sempre um crime...
Para que? Essa é a necessidade pálida que há entre os homens. O homem moderno que trocou sua disposição de luta pela sobrevivência e reprodução para se entediar com a disputa de sempre ser melhor que os outros homens, não como reprodutores, mas, como melhores vendedores, médicos, dentistas, engenheiros, advogados, políticos, administradores e toda sina de ocupação social. É o ter no lugar do ser. Tudo ao redor do homem e de suas invenções são corruptíveis, inclusive sua própria vida e do planeta aonde ele habita, não há melhoria, ao contrário, só trabalho, correr atrás do vento, improdutivo.
Maranata, Senhor.

Nenhum comentário:

Postar um comentário