sexta-feira, 12 de junho de 2009

Chuva Branca.

A cidade hoje acordou sob um imenso chuveiro. A chuva de tão intensa não permitia ver sequer do outro lado da rua. Lembrei-me imediatamente do livro “ Chuva Branca” do saudoso Paulo Jacob, onde a chuva é descrita como uma capa tão densa que não permite ao caboclo ver a uma pequena distância, então, o instinto manda-o aportar seu barco em qualquer lugar que lhe dê um mínimo de segurança. Lá ele fica até a tormenta passar.

Lembrei-me, quase de imediato, de um dia na Costa do Catalão, já passado o encontro das águas, onde o Negro teima em adentrar no Solimões, e, vice versa, sem sucesso algum, de um temporal, sem aviso algum, e, de um “toró” intenso, caracterizando a tal chuva, e, sem dar tempo de defesa ao comandante do braço. As ondas enormes pareciam querer engolir, literalmente, a pequena nau e a chuva não permitia fazer-se um prognóstico satisfatório em qualquer direção. Os olhos atentos e experientes do comandante, seu instinto de preservação da raça, nos levaram a uma travessia segura, porém, muito angustiante com as enormes ondas jogando o barco de um lado para outro, para cima e para baixo, às vezes em uma altura de três a quatro metros acima da superfície. Todos encolhidos sentados em bancos ou no chão, pedíamos a Deus, cada um em seu jeito, que nos concedesse a graça de terminarmos a atravessia ilesos. Tínhamos em mente os perigos que o rio enfurecido pelos ventos e pela chuva, nos ofertava. Sabíamos que assim como nós outros barcos não estavam vendo um palmo à frente, o que poderia ocasionar uma trombada de um barco no outro. Também que poderíamos ser atingidos por grandes troncos de árvores, produtos do fenômeno da terra caída, às vezes, esses troncos ficam submersos e mesmo com uma límpida visão não é possível vê-los, ocasionando um real perigo para o barco, pois, ele se encontra submerso em posição vertical, e, quando abalroado desce, afundando e sobe numa velocidade estúpida, normalmente, causando perfuração no barco que dependendo desta abertura pode até naufragar.

- Oh! Deus ajuda-nos. Era o clamor geral.

Os ventos, às vezes, nossos amigos diminuíram a velocidade amenizando a superfície da água, também, afastaram as nuvens de chuva, aumentando sensivelmente a visibilidade, e, então respiramos aliviados. Umas pequenas ondas, marolas, ficam apenas para lembrar a fortaleza e valentia do grande rio.

Olho para fora de minha varanda, situada no décimo sexto andar do prédio e vejo que a chuva amenizou tanto quanto a daquele dia que acabo de descrever. Lá longe consigo ver uma faixa cinza, talvez das nuvens de chuva indo embora. Observo a copa das árvores, vistas de cima, mais verdes e viçosas. Nenhum pássaro no céu, sinal de que estão desconfiados de que a chuva possa voltar. Só o barulho enfadonho dos motores dos carros passando lá embaixo me lembra que este é um dia normal. A chuva foi-se, levando de enxurrada a nostalgia e mostrando a face do incessante trabalho dos humanos. Corre-corre desenfreado parece até o rio correndo sem freios, atropelando e derrubando tudo que vê pela frente em sua correnteza sem normas, só interessando chegar lá.

Um comentário:

  1. É. Tem vezes que somos levados a nos abater por essas ondas encapeladas. Parece que vamos mesmo submergir, mas ainda bem que me meio às densas nuvens, vemos a luz, sentimos sua presença e direção, nos enxugando a face e nos motivando a irmos em frente. Depois do vendaval, sentimos melhor a Graça inefável de Deus com maior clareza e amplitude.

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